01 julho 2016

O menino do pijama azul



Uma notificação e muita falta de vontade, respondo talvez com alguns dias de indiferença a impessoal mensagem – educação diante da irrelevância. Apenas mais um rosto bonito, entre tantos, nada além de uma estranheza entre os ícones de notificação do smartphone. Com algum espaço de tempo duas (quem sabe três?) outras novas notificações do mesmo perfil, e minha mesma disposição. A porra do alarme não tocou- não o do smartphone e sim o meu - não me preveni e o perigo se aproximava a passos calmos. Sem perceber eu me perdi.
A culpa, o vacilo, o primeiro olhar, o selo da carta do suicida, tudo minha responsabilidade: “Desdita hora em que dei like na imagem sorridente”, ainda lembro a #tag que me fez esbarrar naquele que hoje eximo de culpa. Mas o desejo me guiou, desejo bobo, desejo mecânico, sem propósito de ser, desejo, talvez...
Se o poeta afirmou que as cartas de amor são ridículas é porque não sabe o quanto risíveis e medíocres são as mensagens por rede social – a tecnologia a serviço do vexame e exagero.
Poderia eu justificar minha queda exaltando o quão belo é o objeto do meu desejo, o ideal grego com um beicinho perfeito e a voz que me acalma – sim neste ponto já estamos a conversar por horas via ligação de voz (a primeira durou exatas 2 horas e 23 minutos) logo eu que odeio falar ao telefone, mas não vou me ater ao ideal de beleza alcançado, porque por mais insano que pareça não fazia a menor diferença. Ele é mais do que um pedaço de carne, por mais que ele sempre se colocasse como tal – pobre menino.
Sexo, discussões ferrenhas, preocupação em excesso, doses de ciúmes, suspiros, ansiedade, uma nossa música, e até um pedido de namoro, isso tudo e outras tantas coisas nossas (minhas?) fizeram parte do turbilhão desse improvável encontro.
Hoje me cabe a vergonha. Não sei lidar com minhas imperfeições e não aceito ter me comportado como um completo idiota que se apegou a uma fantasia construída deliberadamente com o objetivo de nunca de verdade ser ou talvez (quem sabe?) de entreter – nem isso fui capaz.
Sigo a timeline, que é vida também, com algumas escoriações, ainda mais descrente nas possibilidades, e mais fervoroso e fiel ao medo – não me abandone e me faça ouvir o alarme.
E o menino de pijama azul ainda está aqui, não consegui soltar sua mão e o deixar ganhar o mundo e só assim perder o medo de ser feliz e fazer, de verdade, os outros felizes. O menino ficou e o homem partiu para mais uma fantasia; que ele reencontre com o menino e seja quem sabe inteiro.

13 outubro 2015

Fingir que não mais me importo

Ele ocupava o maior tempo das minhas horas, e isso me incomodava. Quando a presença daquela ausência ficava constante eu me questionava o motivo pelo qual ele “estava” comigo o tempo todo; decidi não racionalizar e aceitei que de uma forma um tanto torta a vida dele era prioridade na minha. Mudei hábitos, compatibilizei horários e não escondi minha preocupação – às vezes exagerada – com ele. No início busquei ser discreto, mas em dado momento já não me policiava quanto minha necessidade de saber dele, de fazer ele se sentir bem, de estar com as mãos sempre estendidas e ao alcance das dele.  
Nós juntos não formávamos um casal, mas aos olhos de qualquer desatento “nós" éramos “um”; o casal certinho e bonito que ninguém problematizava e que na contramão das reações sociais todos naturalizavam e acreditavam ser ad eternum...
Irritava-me a certeza alheia, uma vez que nada além de amizade era a base da nossa relação; mas também dei de ombros e continuei a cuidar dele, e rir com ele, e dormir pensando nele assim como acordar com ele no meu primeiro pensamento.
A gente navegava sem destino e necessidade alguma de um porto ou mesmo nascer de sol; o tempo, a sina, a construção, o dia de amanhã, nada interferia no oceano calmo em que nos transformamos. Mas uma tempestade chegou, e ela era da cor dos nossos olhos já descritos por Renato Russo; dormíamos e nem sequer percebemos a revolta. Apenas nossos corpos nus, náufragos, doídos, separados em lados opostos da ilha em que cada um hoje vive.
Não tivemos nem sequer tempo de brigar, inventar desculpas quaisquer, sentir a dor avassaladora da “separação”, arrepender-se ou mesmo maldizer o outro.
Ele ainda está aqui, agora mesmo divide meu travesseiro e a todo instante atravessa meus pensamentos com constância, mas é preciso fingir. Volto a ser aquele que nunca se importa, que está acima dos sentimentos e desejos; finjo e sigo – um novo barco vai me resgatar  e vou capitanear a fim de buscar um porto, meu porto, eu porto. Você horizonte.

22 dezembro 2014

O salino gosto de uma não foda


Primeiro dia de Verão, e ele mostra a que veio; um calor absurdamente sufocante que incomoda até mesmo os mais coloridos e saltitantes entusiastas da estação da luminosidade, música alta, calcinhas suadas e peitos à mostra.
Cinco da manhã e eu tentando ler um livro, que é dos mais chatos que já li na minha medíocre vida, e não bastasse o enfadonho emaranhado de palavras ainda há mosquitos famintos a circular, picar, sugar e tornar tudo ainda mais catastrófico.
O cão que não late é sujo e faz passar em frente à janela de vidros empoeirados aquele que não é meu amigo, namorado, amante ou seja lá o que poderia vir a ser: Com tempo disponível e desejo acesso a gente transa, aliás nem sempre ele me fode, felação e algumas mordidas e encoxadas às vezes é a medida do encontro, desencontro, um não ponto, opondo à rotina, desdita de dois tortos.
Com o dedo em riste eu afirmo, irritado, algo que ele fez fora do roteiro predeterminado; álcool e desejo o fizeram se expor (me expor) e extravasei minha raiva quase iracunda e meio belicosa. Briguei, expliquei e ignorei.
Suas mãos e pau em mármore não deixavam dúvidas, uma desculpa alinhada em promessa de não mais repetir o excesso e o enlace dos braços suados – quase sujos e salgados. Sua boca salivava tesão e pressa, e a minha negava o que o corpo queria.
E quanto mais ele tentava mais eu negava e excitava; mãos fingindo repelir, língua na nuca, mãos na espádua, costas, bunda. Sussurros ao pé do ouvido, entre linguadas e baba, e sempre a mesma negativa contrariando o que o corpo falava. Gemidos incontidos, mãos desesperadas, sofreguidão de um homem que implorava por prazer e caiu na armadilha egoísta só minha: Por mais que o desejo fluísse dos meus lábios e mãos - sussurros, mordidas e unhas cravadas conscientemente.
Foram mais de duas horas de tortura, tesão, suor e calor; rogar em nome do pai, do filho e espírito santo não foi o bastante. Apoiado em meu dorso ele esfregava o pau e batia uma punheta violenta (desordenada) a fim de ver a mancha branca em minhas pernas, coxas, sobre a roupa. Em vão, depois de diversas tentativas pouco convincentes de findar com a brincadeira, de subjugar suas vontades, eu enfim dei fim ao desespero dele, para desesperá-lo ainda mais – sim era possível.
Abruptamente o empurrei em meio a gemidos e insistências: “Chupa, me dá, só um pouco, pega no meu pau, eu quero gozar, eu vou gozar, só saio depois de você mamar”. Com o pau duro, quente e suado dentro da bermuda jeans ele foi embora contrariado. Com o corpo quente, o desejo atiçado, e uma marca no pescoço pouco aparente não gozei o cigarro depois da trepada possível, mas traguei o domínio das minhas vontades e do meu ego inflado. Meu jogo, minhas regras, eu o único vitorioso. Restou calor, o cheiro dele e meu sorriso satisfeito: “Bem feito...”, e seja feita minha vontade.

06 maio 2014

Sobre sua felicidade




Aproximadamente oito meses, é esse o tempo em que a gente não mais se encontra. As risadas de antes dão espaço para um desconforto e desejo reprimido quando te vejo e finjo que não (é algo físico que chega mesmo a incomodar). Os poucos abraços que me deu, depois de me arrancar da sua vida, apesar de verdadeiros só me causavam medo e uma sensação de perigo iminente. Mudei meu itinerário a fim de não te encontrar por acaso, evito pessoas que possam falar de você; mas nas madrugadas ainda olho para o seu portão com expectativa suicida te ver e quem sabe - mais uma vez - bagunçar sua cabeça e atrair suas mãos. Desisti de você para realizar sua vontade, acreditei que a distância ia trazer minha ausência e esta seria tamanha que você desistiria do seu projeto de vida medíocre e voltaria a querer meus olhos nos seus - engano ingênuo de um romântico às avessas. É triste saber que você está bem, que os nossos planos são apenas seus e que consegue caminhar sem olhar para trás ou sentir a falta da minha mão segurando a sua e meu olhar cúmplice te falando: “Vai dar certo”.
Queria te encontrar aos farrapos, bêbado e sujo choramingando meu nome e maldizendo meu desamor; confesso que sua queda mesmo causando enorme dor ao menos justificaria a minha. Dar sentido a este meu amor ao te olhar nos olhos, me ajoelhar e me juntar à sarjeta em que se encontraria e então me misturar a você saboreando sua dor e te alimentando com o que ficou de mim com sua ausência.  
Não, não estou suficientemente preparado para te ver feliz...
Mas ela, a felicidade, é sua companheira e zomba de mim; resta-me agarrar com raiva os pés do tempo que não tem aliviado minha dor e maltrata ainda meus sentimentos, afinal mesmo o tempo não é mais cruel que você – e é nele que deposito o que sobrou de esperança.
Talvez um dia, não agora, eu possa encontrar um novo sorriso e até quem sabe aquelas caretas que me irritavam e faziam rir; por enquanto sua sombra me pertence e sobrevivo sem saber para onde ir – culpa sua que me mostrou o caminho, mas me abandonou aos perigos da noite fria e foi em busca do sol. Seu sol sou eu, e qualquer lume pode talvez te indicar um novo horizonte, mas este nunca vai te bastar uma vez que sou eu o seu paradeiro.
Vives hoje errante, e eu apenas sobrevivo das lembranças daquilo que um dia fui. E sem minhas asas não faço ideia em que direção seguir porque todos os caminhos me levam a você.

20 dezembro 2013

O cheiro de nós


Lá fora o típico cheiro de chuva, não aquele ideal da chuva molhando a terra e sim o asfalto quente castigado pelos pingos finos (prova de que até mesmo o que não é romântico pode ser doce). Ao lado um maço entreaberto de cigarro fabricado na Indonésia exala um cheiro de especiarias e noites sujas, e mesmo nesta delirante mistura olfativa as minhas narinas buscam seu cheiro, ainda.
O cheiro da tua nuca, virilhas, axilas e do seu hálito; saudades de te abraçar e pedir baixinho para que a vida se encerre ali naquele instante. 
Nada existiu ou existirá além do abraço e seu cheio em mim, em nós.
No player uma música qualquer que fala de amor, o amor pode ser tão ordinário, e eu sinto o ar ficar rarefeito – suspiro à procura do seu cheiro ou quem sabe que você de alguma forma escute o som que sua falta me faz.
Pouco mais de uma dezena de dias para o término de mais um (mesmo) ano, 2013 se vai e sua ausência sei que fica; antes a profecia fosse a vera e “de dois mil não passarás...” assim eu não teria te conhecido e o paraíso seria mais uma história mal escrita no livro de salvação de muitos, inclusive a sua. 
A vida continua pesada sem você, a cada novo dia é como ir à forca e o carrasco faltar. Agonia, desesperança e o fim tal qual o horizonte no mar negro sem luar; a maresia se mistura à dor e nada de sentir o cheiro doce da morte, da morte de “nós” que mesmo em farrapos e putrefato teima em não descansar no túmulo da minha vida.